terça-feira, 22 de novembro de 2016

Cordialidade no Rio Grande do Sul de 2016

Gilberto Freyre, Caio Prado Júnior e Sérgio Buarque de Holanda foram destaques na década de 1930 ao criarem teorias sobre o nosso país. Para Luiz Bernardo Pericás e Lincoln Secco não foi bem assim, no entanto. Os três autores teriam sido “intérpretes do Brasil”, ao lado de Octávio Brandão, Leôncio Basbaum, Nelson Werneck Sodré, Câmara Cascudo, Paulo Freire, Milton Santos, entre outros. Todos pensadores clássicos brasileiros, rebeldes em seu tempo, e renegados pela academia. Certamente a República Velha e a Era Vargas geraram intelectuais sem par nos dias de hoje. Pensando no Rio Grande do Sul de 2016, Sérgio Buarque de Holanda é o mais atual entre os mencionados acima.
A greve dos professores mostra a atualidade de Sérgio Buarque de Holanda

O autor do imprescindível “Raízes do Brasil” foi um dos modernistas brasileiros. Quando não existia a opção no ensino superior para o curso de História, a sua formação foi em Direito. Nascido em São Paulo, viveu vários anos no Rio de Janeiro, conheceu muitos países europeus e foi fundamental para a formulação da Biblioteca Ayacucho, uma referência básica para qualquer estudioso em América Latina. Era extremamente sociável, construiu uma intensa rede de sociabilidade, era conhecido por seus amigos como uma pessoa descontraída, um brincalhão. O ano de 1936 foi o grande marco de sua vida, publicou seu primeiro livro, casou com sua companheira, inclusive nas suas aventuras historiográficas, Maria Amélia Buarque Alvin, além de iniciar sua carreira nas ciências humanas, quando foi convidado para trabalhar no projeto de Anísio Teixeira, a Universidade do Distrito federal. Era um crítico literário, jornalista, professor, sociólogo weberiano, e fundamentalmente um militante político. E a sua principal luta foi através de movimentos pela profissionalização do trabalho intelectual.

Sérgio Buarque de Holanda dialogou com o PCB, participou da Esquerda Democrática, do Centro Brasil Democrático, ajudou a fundar o Partido Socialista Brasileiro e o Partido dos Trabalhadores. Mas merecem destaque sua participação no Instituto de Estudos Brasileiros na Universidade de São Paulo e na Associação Brasileira de Escritores, que se opunha ao Estado Novo de Getúlio Vargas, ao mesmo tempo que promovia o reconhecimento do trabalho intelectual. É exatamente nesse ponto que o historiador pode ser considerado necessário e urgente para o Rio Grande do Sul de 2016.

O governo José Ivo Sartori (PMDB) está parcelando os salários dos servidores públicos do Rio Grande do Sul há vários meses. Outrora o secretário da Fazenda, Giovani Feltes (PMDB) anunciava essa medida impopular, agora o governador usa a área de comunicação para divulgar a informação. Literalmente o governador não dialoga com a população gaúcha. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) proibiu em 2015 o parcelamento de salários de servidores públicos estaduais, mas a lei parece não existir para o governador do estado “modelo para toda a terra”. Uma das categorias mais atacadas pela atual gestão do estado é o magistério. Outra medida do governo para redução dos gastos devido a crise econômica que o estado enfrenta foi aumentar as despesas com diárias e passagens do executivo. Provavelmente se Sérgio Buarque de Holanda estivesse vivo e entre os gaúchos, concordaria com a atitude de diversos professores que registraram Boletins de Ocorrência acusando a prática de tortura psicológica do governo através do parcelamento de seus salários. O magistério é uma das formas de trabalho intelectual, que o estado considera indigno até mesmo de receber salário integral. Um dos professores que divulgaram publicamente a sua denúncia contra o governo Sartori à Delegacia de Polícia foi Kauê Catalfamo, confira o seu conteúdo:

“Sou professor estadual da rede pública de ensino. No dia de hoje (31 de outubro) não pude comparecer ao meu local de trabalho visto que a quantia irrisória depositada em minha conta pelo Governo do Estado não atende as minhas necessidades de transporte e alimentação. Estando eu muito endividado, pois o atraso de salário vem se repetindo mês após mês, cheguei hoje em meu limite financeiro e emocional. Já tive cortes de luz, de água, constrangimentos diversos por conta do atraso de pensão do meu filho. Sempre priorizei o comparecimento em meu trabalho em detrimento de meu próprio bem estar e daqueles que dependem de mim financeiramente. Dito isso, pretendo através desta queixa evitar a punição com falta já que não há condições mínimas para o exercício de minha profissão.”

O “homem cordial” apareceu pela primeira vez em uma carta do poeta Ribeiro Couto, significando hospitalidade e bondade. Sérgio Buarque de Holanda usou com novo sentido, de aversão a formalidade, ao ritualismo, para explicar como a democracia no Brasil era precária. Ela deixou de ser? Quando o salário deixa de ser um direito dos professores, as reflexões da década de 1930 se tornam nossas contemporâneas, pois o estado do Rio Grande do Sul desconsidera o magistério enquanto uma profissão, desprezando a formalidade jurídica e os seus avanços.

sexta-feira, 11 de novembro de 2016

O nordeste brasileiro insurgente: o exemplo da Revolução Pernambucana de 1817

O ilustre intelectual Oliveira Lima considerava a Revolução de Dezessete a única revolução brasileira digna do nome, e Câmara Cascudo dizia que foi a mais linda, inesquecível, arrebatadora e inútil das revoluções brasileiras. Os dois classificaram o acontecimento de seis de março em Pernambuco como uma revolução.  E, ainda assim, a Revolução Pernambucana de 1817 é desconhecida entre nós. Quando falamos em Revolução de 17, nos vem a mente a Revolução Soviética, que aliás bem que poderia ser considerada como algo ocorrido desde 1905, com o Domingo Sangrento. Até quando iremos continuar desconhecendo a nossa História?

A Revolução Pernambucana de 1817 aconteceu quando éramos Reino Unido de Portugal, Brasil e Argarve.

Esse episódio merece a alcunha de revolução, ou é mais justo com a sua História, tratá-lo como rebelião, revolta, levante, intentona, insurgência? Quando o povo e os soldados armados depuseram o governador, e esse povo era formado por cerca de quatrocentas pessoas, de todas as cores, mal vestidos, todos vitimados pela fome, pela carestia e pela seca? Era impossível para os naturais da América Portuguesa mudar de classe social, pois o comércio somente era permitido aos portugueses. O movimento tomou o poder e logo estabeleceu um Governo Provisório que foi eleito, e passou a mediar todos os setores da economia. Fizeram parte deste movimento Frei Caneca e Pedro da Silva Pedroso, um revolucionário de três revoluções: 1817 e 1823 em Pernambuco, e 1824 na Confederação do Equador. Pertencente a Terceira Companhia do regimento de Artilharia, foi um proselitista da causa negra, promovendo a primeira lei abolicionista da História do Brasil.

Mas este movimento que durou apenas três meses, também gerou a primeira presa política, que foi a primeira presidenta do Brasil, a Bárbara de Alencar, futura avó de José de Alencar, que presidiu a República do Crato. Foi influenciado por acontecimentos pretéritos, como a Revolução Haitiana, a Revolução Francesa, a Independência dos Estados Unidos da América, a seca, a maçonaria e a vinda da família real para a colônia. Pernambuco era à época, a vanguarda das idéias iluministas no Brasil Colonial e pioneira na nossa independência. Pela primeira vez o Brasil apareceu como país autônomo na imprensa internacional.

Há controvérsias sobre quais províncias apoiaram o movimento, sabe-se que Rio Grande do Norte, Ceará, Paraíba e Alagoas aderiram ao que também ficou conhecido como Revolta dos Padres.  Foram muitas províncias que se insurgiram durante a vigência do  Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, ganhando destaque o nordeste brasileiro.

sábado, 1 de outubro de 2016

Vários “Nascimentos” às vésperas das eleições de 2016 por todo o Brasil ou criminalização da democracia representativa?

Vivemos momentos difíceis no âmbito da política. Todos devem se lembrar do filme Tropa de Elite 2, aonde o herói Nascimento espancava o político corrupto em defesa da sua família, contra o sistema da  corrupção. Nos cinemas, as platéias ficaram comovidas e talvez tenham se sentido vingadas quando o nosso novo salvador resolvia os problemas do país por seus próprios meios. E o fazia personificando o sistema em uma única pessoa. Hoje os jornais nos mostram os outros Nascimentos, os policiais e ex policiais que formam as milícias, grupos armados que cobram pelos seus serviços. Há candidatos que buscaram apoio destes grupos para logo mais, no domingo. Os valores são elevados, causando obviamente muitos lucros. As milícias, dizem, cobram até 120 mil reais de candidatos que queiram fazer propaganda em áreas de seu controle. Mas as milícias oferecem também diversos serviços aos moradores, como transporte, segurança, venda de bujões de gás e instalações de wi fi. Provavelmente seja possível afirmar que as milícias sejam mais fortes aonde o estado seja mais fraco, ou menor.

Em carreata, candidato a prefeito foi assassinado no interior de Goiás
Um levantamento, realizado pelo jornal O Estado de São Paulo, apontou que ao menos 96 pessoas, entre prefeitos, secretários municipais, candidatos e militantes, foram executadas por motivações políticas entre janeiro e setembro deste ano de 2016. As proibições de doações empresariais, o menor tempo de campanha, os pelo menos vinte candidatos assassinados e o “Fora Temer”, não serão os únicos fatos lembrados nas retrospectivas do final de ano. Por todas as regiões do Brasil continuam acontecendo execuções de políticos, e o termo pode ser aqui utilizado, pois políticos não são apenas os candidatos aos cargos públicos. A violência acontece com os familiares dos candidatos, com os militantes, contra os políticos, entre eles, e para além deles.

Em abril, o Movimento Estudantil Popular Revolucionário denunciou agressões sofridas por seus militantes, cujas violências teriam sido praticadas por dirigentes do Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado. Em setembro um ex militante do Partido Comunista Brasileiro publicou fotografias em seu perfil no facebook se referindo a agressões físicas feitas por pessoas ligadas ao mesmo partido. Que por sua vez teve suas reuniões vigiadas por policiais, mais de uma vez, em meses anteriores. A violência continua, portanto, e intensificada.

As disputas eleitorais começaram oficialmente em agosto, e hoje se verificam assassinatos, somente aos candidatos, em todas as regiões do Brasil. Com uso de armas de fogo e de objetos cortantes, como facas e chaves de fenda. O estado aonde houve mais ocorrências foi o Rio de Janeiro. E nesse período, desde agosto, foram mais de cem falecimentos de candidatos, sem existir informações sobre as mortes. Houve execução durante carreatas, facadas no pescoço, disparos de fuzil em comitê de campanha, tiros quando o político saía de casa, candidato para reeleição morto junto ao seu filho, e muito mais. Houve uso de armamento das forças da segurança pública. Há filmagem com assassino usando colete da polícia, nos trazendo a lembrança o nosso herói dos cinemas brasileiros, como o Nascimento.

A violência acontece com partidos diversos, envolvendo todos os que participam do falso antagonismo volta-querida-fora-temer. O partido que teve mais vítimas foi o PSDB, mas o PMDB, PTB, PRB, PCdoB, PDT, PEN, PMB, PP, PSB, PSL e PTC também perderam candidatos assassinados. Em Governador Nunes Freire, no Maranhão, em 2014 houve espancamento com várias fraturas no crânio, resultando na morte do vereador Paulo Lopes Sales, do PT. Lembremos que simplesmente usar a camiseta do Internacional de Porto Alegre, já bastou para acontecer agressão. Por várias maneiras, a nossa democracia representativa, estará sendo combatida?

terça-feira, 27 de setembro de 2016

Um alerta sobre os bancários em paz com sua guerra

Não deve-se temer o anacronismo. Que nada mais é que colocar como ponto de partida os nomes dos acontecimentos para explicar a nossa história. Se pensarmos através do medo do anacronismo, vamos nos censurar e pensar que antes de Heródoto não existia história, porque ele foi o primeiro a registrar em escrita esta palavra. Mas o que era história em seu tempo, senão a narrativa dos acontecimentos? Populações sem escrita também transmitiam os fatos através da fala e de outras maneiras. No século XVIII com o iluminismo, a ascensão social da burguesia e a industrialização, tudo mudou para a história, que sofreu uma transformação. Mas foram os acontecimentos que alteraram a palavra história, que passou a se referir também a própria realidade.

E. P. Thompson em “Costumes em comum”, chamava a atenção para os riscos de interpretar a história inglesa através do vocabulário do período. Palavras como “pobres” e “população” eram carregadas de preconceitos de classe. Foi quando o trabalho tornou-se crime, já que através de jogos de palavras no âmbito jurídico, o direito de uso a terra comunal passou aos proprietários. As leis do parlamento não podem, portanto, criar um medo do anacronismo. E Thompson sabia, como poucos, enfrentar esse temor.

Será que no Brasil não existiram greves antes da invenção da palavra? Os ingleses chamavam de “strike”, os espanhóis de “huelga”, os italianos de “sciopero”, os franceses de “greves”, e no Brasil, levava o nome “paredes”. Nas nossas primeiras fábricas, milhares dos operários eram ainda negros escravizados, que protagonizavam as lutas dos trabalhadores no campo e na cidade, durante a monarquia e a república, antes e depois da vinda dos assalariados imigrantes italianos e anarquistas. Arrisco dizer que antes das paredes existiram os quilombos. Mas o horror ao anacronismo, este combatente do eurocentrismo, nos faz pensar que antes da palavra “grève”, greves não ocorreram. Nada mais enganador. A palavra é menos importante que a história vivida. No Brasil sempre ocorreram paralisações coletivas de trabalho como forma de protesto e de barganha, e tanto faz o nome que seja dado. Quilombo, parede, ou greve. Ou simples vagabundagem!


É verdade, que hoje entre os movimentos grevistas, existem trabalhadores que usam as paralisações para adiantar as suas férias, são as “greves de pijama”. E na greve nacional dos bancários não é diferente. Esta que é considerada pelas lideranças sindicais como uma das maiores greves dos bancários nos últimos anos está longe de ser perfeita. Mas há uma confusão de palavras, entre “bancários” e “banqueiros”. Esses mesmo nas crises sempre lucraram, principalmente durante os governos de Lula e de Dilma. Enquanto aqueles, têm em suas pautas questões legítimas, entre elas: as demissões em bancos privados, as terceirizações, risco de privatização de bancos públicos, assédio moral, pressão por metas, precárias condições de trabalho e de atendimento, acúmulo de funções dos estagiários. As roupas sociais que os bancários são obrigados a usar, são compradas pelo trabalhador. Não é a toa que os bancários têm altos índices de suicídios. Não deve-se, portanto, confundir as palavras e tratar bancários como se banqueiros eles fossem.


Grevistas divulgando algumas das suas pautas

Os bancários paralisaram seu trabalho para barganhar  um aumento real dos seus salários. Cerca de 14.000 agências foram fechadas no Brasil, em uma greve que iniciou em 6 de setembro. Pela primeira vez eles sentam nas mesas de negociações, com um novo governo federal. Um dos resultados foi a prisão política da funcionária do banco Santander, a sindicalista Maria Rosani Gregorutti, em São Paulo. A truculência policial mostra o “notório saber” do estado para lidar com os nossos grevistas. Ainda temos a questão social como questão policial?


A confusão entre “bancários” e “banqueiros” não é a única, também há entre “direitos de consumidor” e “direitos cidadãos”. E a greve é um desses direitos democráticos. E há diversos precedentes em nossa História. No vocabulário de nossas leis existe a palavra “democracia”. Mas não podemos ficar apenas nas palavras, que ainda hoje ludibriam qualquer entendimento sobre nossa realidade. Ser diretora executiva do Sindicato dos Bancários de São Paulo é hoje causa para detenção? Alerta!

sábado, 10 de setembro de 2016

Alerta, Lúcio Júnior Espírito Santo!

As tentativas de universalização do feudalismo atingiram não somente o Japão, como a Escócia, o Rio Grande do Sul, o Brasil, a América Latina. Considero indevido deduzir feudalismo de “grandes plantações de cana de açúcar para exportação” ou “capitannias hereditárias gerenciadas por nobres portugueses”, pois desta forma há uma distorção da realidade concreta brasileira, nos colocando como uma continuação da Europa. A nossa origem é de Pindorama. O colega de debates Lucio Júnior Espírito Santo está enganado. Por que razões?
Não considero os modos de produção o mesmo que mercadorias exportáveis, sim resultados de relações sociais específicas de cada lugar, em cada época. Denominar como atraso uma grande diferença em relação aos modelos europeus é eurocentrismo. Sugiro, pelo contrário, tratar o Brasil como atrasado politicamente, por exemplo, comparando com a  História Política da Colômbia. Sendo assim, o modelo para comparação está situado em nosso continente. Além de eurocentrismo, há ainda um resquício de trotskismo na tese de feudalismo brasileiro, está lá em “A história da revolução russa (a queda do tzarismo)” a defesa de feudalismo no local aonde realizou-se a revolução bolchevique. Moniz Bandeira chegou a localizar em Leon Trotski a tese  de feudalismo brasileiro. Algo muito semelhante está acontecendo no Brasil, aonde intelectuais, como Lúcio Júnior Espírito Santo, buscam tornar o feudalismo um modo de produção universal, chegando aos nossos trópicos, pensando promover outra revolução, com o nosso país grávido de  um comunismo.
Moniz Bandeira
O feudalismo foi uma transição entre o escravismo e o capitalismo europeus, quando o modo de produção escravista romano mesclou-se com os modos de produção germânicos. Ora, os romanos e os germânicos não estiveram presentes no Brasil colonial. Sejamos criativos como foi Mariátegui, que denominou um dos elementos do regime colonial peruano de “gamonalismo”. Se no Brasil teve cambão, direito de pernadas, meação, por que voltar atrás e universalizar o feudalismo? Será a deficiente formação em História a causadora principal deste engano por Lúcio júnior Espírito santo? Vejamos o que o autor Clóvis Rossi nos apresentou em seu livro chamado “A contra-revolução na América-Latina” referente ao feudalismo americano: “Foi só em 1952, ano da chamada Revolução Nacional, que a Bolívia saiu do virtual feudalismo em que se encontrava para aproximar-se do século XX, com um atraso, portanto, de 52 anos em relação ao início do século. Na América Central em geral, com a possível exceção da Costa Rica e, mais recentemente, da Nicarágua, o regime sócio-político ainda está mais próximo do feudalismo do que das formas mais contemporâneas de governo e/ou participação popular.”
Sempre que foi citado o feudalismo é para comparar com o modelo europeu de desenvolvimento. Ou de opressão contra os trabalhadores. Caio Prado Júnior negou o feudalismo para o Brasil, argumentando no sentido de sua existência. E Nelson Werneck Sodré, praticou o exato oposto, ao afirmar negando. Mas, segundo alguns teóricos, o método marxista é o de negação da negação.
Alerta, Lúcio Júnior Espírito Santo!

Como os Movimentos dos Secundaristas invalidam o programa Escola Sem Partido

Em 2005 surgiu de dentro do Fórum Social Mundial, o Movimento Passe Livre, que liderou a primeira fase das manifestações de 2013 contra o aumento da tarifa dos transportes públicos. Foi um movimento que obteve vitórias em diversos estados brasileiros e, com o tempo, ganhou maior complexidade, e ainda hoje é  incompreendido. Uma das razões foi ter contribuído com o recente afastamento da presidenta Dilma Roussef. E também por ter politizado diversos adolescentes, entre eles os secundaristas de São Paulo, que passaram a ocupar as escolas, se insurgindo contra o fechamento de cerca de duzentos colégios e demissão de profissionais da educação. Trezentos mil estudantes se uniram aos pais, professores, e também a outros trabalhadores e a movimentos sociais. Os secundaristas de São Paulo barraram, ainda que temporariamente, a reorganização imposta pelo governador Geraldo Alckmin do PSDB, que demitiu o Secretário da Educação. O Movimento Secundarista em 2015 foi exitoso, principalmente devido a sua organização e seriedade, constatada pelo filósofo e pedagogo Dermeval Saviani, que declarou: “Fui lá conversar com os alunos e percebi a seriedade deles, a capacidade de visão da importância da educação, a atenção para o risco da entrada de estranhos na escola para depredar e culpá-los”.

O Colégio Estadual Julio de Castilhos foi a quinta escola a ser ocupada em Porto Alegre
Para Pablo Ortellado, as ocupações de escolas em São Paulo “são o filho mais legítimo das manifestações de Junho de 2013”. Em 2016 os secundaristas ocuparam a Assembleia Legislativa de São Paulo por uma instalação de uma CPI para investigar o desvio de recursos públicos para a merenda escolar, e o movimento chegou ao Rio Grande do Sul, respingando no ensino privado. Alunas secundaristas e do ensino fundamental protagonizaram o que na aparência seria uma luta para poder usar shortinho, mas o manifesto das alunas do colégio privado Anchieta mostrou que este movimento estava ligado a uma onda de politização estudantil iniciada desde 2013. Não houve ocupação do colégio Anchieta, mas na divisa com o Uruguai, o Bloco de Lutas pela Educação Pública organizou a ocupação da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA). No estado gaúcho, mais de cento e cinqüenta escolas foram ocupadas.
Talvez em resposta a isso tudo, foi enfatizada uma campanha em torno do programa da Escola Sem Partido, quando os liberais brasileiros pediram socorro do Estado, para impedir a continuação deste processo de politização dos estudantes, para muito além da polarização fora-temer-volta-querida. Provavelmente os defensores do Projeto de Lei inspirado no programa acreditem que todo o Movimento dos Secundaristas seja resultado da doutrinação esquerdista. Mas essa suposta doutrinação não existe nas escolas. No Rio de Janeiro, após cerca de setenta escolas estarem ocupadas, outro grupo de estudantes criaram o movimento “Desocupa Já”. O líder do movimento, o secundarista Luan Freitas, afirmou: “Com essa situação, tiraram o pouco do direito que eu tenho de estudar, que o que eu mais quero é estudar. Eles são chamados de revolucionários e eu sou só um estudante que quer estudar”. O movimento mostra que os secundaristas não possuem uma uniformidade de idéias: enquanto uma parte dos estudantes brasileiros luta por melhores condições de ensino para todos os seus colegas e de trabalho para todos os seus professores, outros se esforçam por mais condições individuais para passar nos vestibulares, e nas provas do ENEM. E para despolitizar os estudantes, o alvo deverá ser as ruas, a origem da agitação política de hoje. Porque as nossas escolas reproduzem a sociedade aonde elas estão inseridas, os secundaristas são diversos como variados são os adolescentes do Brasil. Em que medida seria correto considerar uma unidade, estas pessoas que estão em uma fase de transição, como supôs o programa Escola Sem Partido?

quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Dois paradoxos americanos

Neste breve texto, aludo a dois paradoxos americanos, como o socialismo que impõe desigualdade social, e uma proposta de História não empírica. 

 A América Central Ístmica teve a sua população urbana triplicada nas três últimas décadas, sendo uma das populações mais afetadas pelo aquecimento global. Na Costa Rica, o salário mínimo agrícola de fome, contribui para a desnutrição crônica de crianças menores de cinco anos. Os governos desta parcela da América preferem investir em armas e modernização dos seus exércitos. Pouco se importam com a educação escolar, já que em toda a América Central Continental a metade dos jovens entre 15 e 24 anos estão fora do sistema educativo. A desigualdade social está aumentando, principalmente na Guatemala, em Honduras e Costa Rica. Nicarágua é o país campeão no campeonato do aumento da pobreza. O lugar do orteguismo está unido aos demais países vizinhos, fazendo triunfar os seus princípios socialistas de reprodução do subdesenvolvimento humano no istmo. Os valores socialistas cultivados pelo governo de Daniel Ortega se confundem com o valor da família.

Países da América Central Ístmica
A História é uma ciência, a que está em todas as outras, e por outro lado está solteira sim, mas sozinha jamais. Intelectuais diversos sem formação nesta área contribuíram para o estado atual deste tipo de saber, que é profundamente democrático, ao se integrar desde sempre com conceitos oriundos da biologia, da arquitetura, da economia, entre outros. No conjunto de livros que formam a historiografia, estão autores de dentro e de fora da História. A História é uma babel teórica, aonde a convivência entre diferentes teorias é o estado normal das coisas. Por isso que ela jamais aparece sozinha. Lá está a ideologia, o interesse, o sentimento, de cada um que transmite o conhecimento histórico, e demais ciências ou outras formas de saber. Tudo junto e misturado. Está nela, às vezes a negação da ciência, em uma visão aonde os documentos, e o passado, não seriam seus limites. Conforme José Antônio Martins, “A ciência pra mim é capacidade de previsão e é uma coisa que distingue claramente a espécie humana das demais espécies.”

Estará o professor propondo um retorno de nossa ciência, todas elas, aliás, para os processos estocásticos, criados para entender os mercados de ações? Ou ele veja os acontecimentos como uma coleção de variáveis aleatórias, condições iniciais para uma equação de trajetórias possíveis para a evolução das sociedades? Afinal, o futuro não foi ainda experimentado.
 
Copyright 2013 Coluna do Rafael Freitas